Martha
Abreu, em seu trabalho em torno da Festa do Divino Espírito Santo de Santana,
faz um apanhado histórico das festividades que ocorriam nesse local, tentando
encontrar os momentos de ascensão dessas festas e os de declínio. Além disso,
procura entender as relações que se davam sobre esse espaço, as camadas sociais
que o utilizam. Para isso ela se utiliza de documentos da época, principalmente
ofícios da Câmara Municipal, de relatos de memorialistas e descrições em obras
literárias. A partir desse trabalho podemos entender como as diversas esferas
da sociedade - política,
religiosa e civil - fizeram uso do Campo de
Santana, nos momentos festivos, para atender aos seus interesses. Outrossim, é
a reflexão sobre quais foram os motivos que levaram esses eventos a
desaparecerem, se foi consequência do processo de modernização; da repressão
por parte das autoridades; ou se simplesmente caíram no esquecimento e no
desuso.
Antes
de receber o nome de Campo de Santana o local era chamado de Campo de Domingos.
Isso se dava pelo fato de haver no local uma capela de São Domingos que fora
erguida pela Irmandade dos Pretos. Devido a desavenças entre esta irmandade e
os "crioulos e soldados do regimento dos pardos", esses construíram
uma capela a Santana separada dos "pretos".
Pouco
tempo depois o campo ficou conhecido como Campo de Santana. O local era de difícil
acesso, e também inóspito por esse motivo era pouco visitado por pessoas
abastadas. Com isso o Campo se tornou um recinto onde os negros e mestiços se
sentiam mais livres. Foi construído em Santana um império, fruto de uma doação,
ali os negros faziam suas festas e coroavam um imperador. Talvez por esse
motivo - a autora não deixa muito claro, aparentemente adepta à Nova História Cultural,
ela prefere descrever e colocar pouco a sua opinião - houve interesse por parte
das autoridades, já que o Brasil passava a ser um Império, em começar a
urbanizar o local dando acesso as festividades. Acredito que a coroa
acreditava, em princípio, que uma festa com imperadores fictícios ajudasse a
introjetar a ideia de Império na consciência da população.
Claro
que devem existir outros motivos, talvez a própria necessidade de urbanização
da cidade devido à vinda da corte para o Brasil, ou fruto do próprio processo
de modernização. Não descarto nenhuma das hipóteses, já que a história não é
movida por um único elemento separado.
É
importante ressaltar que o Campo de Santana sofreu várias transformações. Nele
foram construídos a residência do primeiro Intendente Geral da Política, o
Palacete do Campo dos Arcos, o Museu Nacional e a própria Câmara dos
Vereadores. E com isso também recebeu vários nomes, tal como praça da
República. Isso deixa evidente que o local serviu de palco de representação e
de autorrepresentação de vários grupos sociais como foi abordado em vários
trechos do texto, por exemplo as danças e festas realizadas pelos negros que
serviam para fortalecer uma identidade em desenvolvimento - digo em
desenvolvimento porque os cultos eram oferecidos aos santos católicos, ou seja,
a religião dos exploradores; entretanto essa era a única forma dos negros terem
um certa liberdade, assim através do uso dos costumes os exploradores os negros
foram criando espaços seus e dessa forma possibilitando um identidade própria o
que serviria na luta pela libertação -; os comerciantes que usavam o espaço
para obterem lucro e de certa forma lutarem pela "livre iniciativa" -
as aspas é devido a ideia de liberalismo ainda não existir de forma desenvolvida,
mas em vários ofícios dos barraqueiros à Câmara dos Vereadores é possível
perceber a necessidade dos comerciantes em terem mais liberdade diante o Estado
para terem mais lucro -; a própria igreja usava do espaço para fortalecer a fé
cristã na região; no campo da política, por sua vez, ocorreram diversas
manifestações, marchas da guarda nacional, a modificação do nome da para Praça
da República e a construção de vários monumentos que representavam a ordem.
A
autora aborda cronologicamente o surgimento e o desaparecimento da festa do
Divino. Em princípio o local, devidos as péssimas condições de estadia, era
usufruído em maioria por negros. Lá eles realizavam suas festividades. Com o
processo de urbanização outras camadas surgiram para prestigiar as
festividades. Isso porém começou atrair aspectos desagradáveis às classes
abastadas e ao Estado. Surgiam assim, delinquentes, que causavam espanto à
elite; comerciantes de todos os tipos,
o que causava desagrado às autoridades já que
eles alojavam em seus recintos jogos que eram mal vistos, além de reunirem grupos
de negros nesses locais - talvez a preocupação da polícia era que esses grupos
de negros se sublevassem contra a ordem -; lavadeiras também usavam o local.
Tudo isso fez com que a polícia começasse a enxergar o campo com receio de que
lá pudesse ser palco de subversão. Daí começa a repressão às festividades
populares. Em princípio não existiam leis específicas que proibissem os
eventos, a polícia simplesmente não permitia o uso do local para qualquer coisa
que parecesse estranho.
Então
surgir as leis que proibiam danças, fogos, barracas, etc. A autora descreve os
eventos e os motivos das proibições dos mesmos, levando o leitor a imaginar os
motivos pelo qual as autoridades perseguiam os eventos. Por exemplo o bailão
tinha sido proibido talvez por que a dança remetesse à Bahia, onde tinha
ocorrido movimentos subversivos. A dança dos velhos por sua vez, quando ocorria
o lançamento das bengalas dava a ideia de que era necessário algo novo
diferente do regime de Império. Porém não é tão simples atribuir as verdadeiras
razões, talvez, como já disse, foram uma confluência de vários motivos: o alerta
no sentido das revoltas que ocorriam no Brasil, por exemplo, fazia a coroa
desconfiar de tudo; mas também tinha a necessidade do estado moderno de ter
controle sobre a vida da população; ou talvez aqueles acontecimentos
simplesmente incomodassem os grupos privilegiados. Esse período foi marcado
pelo declínio dessas atividades. Mas a autora deixa claro a repressão não era
suficiente para enfraquecer as festividades, já que, em locais particulares,
essas danças e costumes poderiam acontecer, mas parece que o verdadeiro desejo
do envolvidos nos eventos estavam em torno do local público.
Depois
desse período a festa do divino volta a ter uma ascensão. A razão talvez seja
devido a coroação do imperador dom Pedro II, a coroa precisou de festas que
fizessem com que a coroação fosse entendida como algo novo. Além disso ajuda a acalmar
os ânimos dos revoltosos, e, de certa, forma com a maioridade forçada do
imperador era necessário era preciso destruir o povo. Pouco tempo depois as
festas caíram em desuso, a autora, porém aponta como os elementos das danças e
costumes ganharam novos aspectos e foram introduzidas em novas danças e
festividades como o carnaval, por exemplo.
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