O termo popular é usado por diversos
autores, além de ser ouvido e outros meios como nos meios de comunicação, na
arte, etc. Nesse sentido faz-se necessário uma análise aprofundada do que seria
esse termo, como ele dialogo com outro e como ele é encarado dentro dos vários
ambientes em que é usado. Para o historiador, sociólogo, e outras profissões
acadêmicas é importante ter conhecimento sobre a forma como está sendo usado
esse termo nos diversos contextos, de outra forma seu trabalho pode ficar
prejudicado.
A Marta Abreu se propôs a fazer esse
trabalho, ela se questionar sobre o termo, procura suas mudanças históricas,
suas relações com outros existentes, suas apropriações pelos diversos setores,
etc. Seu trabalho tem valor significativo para o desenvolvimento das ciências
humanas.
Outros autores também haviam
trabalhado sobre essa questão, porém o trabalho da autora em “Cultura Popular”
leva em consideração os diversos trabalhos já produzidos, por autores como
Peter Burke, Roger Chartier, Cancline, Thompson, e outros, o conhecimento das
opiniões desses autores, sem dúvida, tornam seu trabalho mais interessante,
tendo em vista que possibilita reflexões mais produtivas.
Questionado
o conceito
A autora afirma que o conceito é
visto de forma diferente de acordo com o contexto, em um momento pode ser visto
de forma positiva, por exemplo quando se diz que um determinado artista é
popular, pois é bastante conhecido e admirado; em outros pode representar algo
negativo, como é o exemplo do funk, sendo assim o popular fica associado ao
inculto, ao grotesco, etc.
“Cultura popular é um dos conceitos
mais controvertidos que conheço. Existe, sem dúvida, desde o final do século
XVIII; foi utilizado com objetivos e em contextos muito variados, quase sempre
envolvidos com juízos de valor, idealizações, homogeneizações e disputas
teóricas e políticas” (Marta Abreu)
Outra questão é a comum associação
do popular com o que vem do povo, das massas, porém como definir o que vem do
povo tendo em vista que a cultura não é estática, que elas vivem num processo
dialético de “circularidade”? Nesse sentido, penso que na modernidade fica cada
vez difícil definir o que não seria popular, tendo em vista que uma cultura de
elite tem perdido significado. Vejamos o que diz a autora sobre essa questão:
“Por outro lado, se cultura
popular é algo que vem do povo, ninguém sabe defini-lo muito bem. No sentido
mais comum, pode ser usado, quantitativamente, em termos positivos -
"Pavarotti foi um sucesso popular" – e negativos - “o funk é popular
demais". Para uns, a cultura popular equivale ao folclore, entendido como
o conjunto das tradições culturais de um país ou região; para outros,
inversamente, o popular desapareceu na irresistível pressão da cultura de massa
(sempre associada à expansão do rádio, televisão e cinema) e não é mais
possível saber o que é originalmente ou essencialmente do povo e dos setores
populares. Para muitos, com certeza, o conceito ainda consegue expressar um
certo sentido de diferença, alteridade e estranhamento cultural em relação a outras
práticas culturais (ditas eruditas, oficiais ou mais refinadas) em uma mesma
sociedade, embora estas diferenças possam ser vistas como um sistema simbólico
coerente e autônomo, ou, inversamente, como dependente e carente em relação à
cultura dos grupos ditos dominantes” (Marta Abreu)
Na minha visão, uma cultura de
elite, seria o que existiu em momentos passados como uma opera, teatro cristão,
etc. Hoje, o que vem das classes mais abastadas recebem também o nome de
popular. Por exemplo, a MPB diz isso em seu próprio nome, Música Popular Brasileira,
no entanto essa música é consumida por setores médios que tem muitas vezes uma
escolaridade mais avançada que a população comum. Outra música é a chamada Pop
nos Estados Unidos, que é trazida para o país por pessoas mais enriquecidas, e
também são esses setores que admiram essa música. O rock é uma música ouvida
pela classe mais abastada do país, mas será que podemos dizer que não é
popular? Penso que essas músicas são populares por serem um contra ponto aos
valores eruditos, como o MPB, e no caso do Pop é popular por que é uma música
das massas. Penso que não exista mais, de forma bastante clara, uma música
erudita que contraponha ao popular, a elite na falta de identidade com o
popular nacional busca o popular internacional, mas não sai do popular.
Nesse sentido, estou afirmando que
essa ideia de que não existe mais popular e erudito devido haver uma
circularidade é falsa, tendo em vista que o que ocorre é a morte ao erudito, as
classes dominantes não consomem mais cultura erudita e sim popular, no sentido
de ser liberal e não erudito. Poderíamos dizer que existe uma relação de classe
entre o samba e MPB, mas essa relação se dá apenas na diferença entre as
classes que consome essas músicas, porém, ambas são populares e não eruditas.
O popular foi pensado de formas
diferentes desde o início de seu surgimento, por vezes era associada ao
moderno, sendo ela, por tanto, um resquício do atraso, por vezes associada a
identidade de um povo, e que por esse motivo deveria ser preservado. Essa
questão colocou um: dicotomia desde cedo, entender que deveria desaparecer
devido o processo de evolução ou cultivar e conhecer como forma de resistência ao
moderno. Vejamos o que diz a autora:
“Desde o final do século XIX,
no Brasil, a expressão cultura popular esteve presente numa vertente do
pensamento intelectual, formada por folcloristas, antropólogos, sociólogos,
educadores e artistas, preocupada com a construção de uma determinada
identidade cultural. Artistas, políticos, literatos, intelectuais tentaram
responder a estas questões relacionando cultura popular com variados atributos,
por vezes contraditórios: ora com a não modernidade, o atraso, o interior, o
local, o retrógrado, o entrave à evolução; ora com o futuro positivo, diferente,
especial e brilhante para o país, valorizando as singularidades culturais e a
vitalidade de uma suposta cultura popular, responsável pelo nascimento de uma
nova consciência, uma nova civilização, sempre mestiça”
(Marta Abreu)
A autora destaca que esse termo traz
em si um aspecto de identidade, o popular de fato cria a ideia de grupo social,
de região, etc.. O termo acaba denotando um sentido nacional ou de classe. A
autora mais na frente fala do populismo, que estaria ligado a essa questão. Penso
que essa identidade vai possibilitar que essa questão entre no âmbito político,
fazendo que líderes se apresentem como populistas e ligados ao povo.
Penso que nessa questão o popular
foi usado, ora, pela direita, ora pela esquerda, tendo em vista que para um
poderia significar uma força para o nacionalismo e resistência aos avanços da
modernidade, dando um caráter legitimador de governos populistas como os de
Peron e Vargas; para o outro poderia denotar uma aproximação dos setores mais
pobres e oprimidos, sendo usado por grupos influenciados por Antônio Gramsci.
Vejamos o que diz a autora:
“A partir dos anos 1940/1950,
cultura popular assumiu uma perspectiva política associada aos populismos
latino-americanos, que procuravam oficializar as imagens reconhecidamente
populares às identidades nacionais e à legitimidade de seus governos. O
conceito também foi incorporado pela esquerda, principalmente na década de
1960, tendo assumido um sentido de resistência de classe, ou, inversamente, de
referência a uma suposta necessidade dos oprimidos a uma consciência mais
crítica, que precisava ser despertada O conceito poderia ser encontrado entre
os intelectuais do cinema novo, da teologia da libertação, dos centros populares
de cultura e entre os educadores ligados aos princípios de Paulo Freire” (Marta
Abreu)
O popular desperta com os romancistas
que começam a estudar as culturas que resistiam à modernidade. Mais tarde os
folcloristas vão dar continuidade a esses estudos compilando os materiais. O
termo cultura teria nascido na Alemanha tendo em vista que representava uma
oposição ao termo civilização da França, era uma forma de resistência frente
aos valores positivistas da Revolução Francesa. Nesse sentido a Alemanha teria
um caráter de conservadora da cultura nacional.
“Herder, na futura Alemanha,
no final do século XVIII, foi quem pela primeira teria utilizado o conceito de
cultura popular (Kultur des Volkes) sem o sentido valorativo dos iluministas e
com o sentido de alteridade. Segundo Norbert Elias, a criação do conceito de
“Kultur” (Cultura), opondo-se ao conceito iluminista francês de Civilização,
correspondia a um desejo de ascensão de pequenos burgueses que iriam cultuar a
sinceridade, a natureza, os modos simples. Ligava-se à construção das bases da
identidade cultural alemã, em oposição às outras potências européias. O movimento
protagonizado por Herder e pelos irmãos Grimm buscou entre os costumes dos
camponeses - seus poemas, músicas, festas, saberes, histórias e rituais -
encontrar as marcas de uma essência diferenciadora e autêntica, o espírito
coletivo de um “povo” em particular, base para a construção da futura nação
alemã. Os camponeses pareciam, aos olhos destes intelectuais, ter guardado,
desde tempos muito remotos, a tradição que precisava ser resgatada frente às
ameaças da modernidade, da sociedade industrial e da civilização exteriores”
A autora aponta que aqui no Brasil
os folcloristas foram vistos como não científicos pelos intelectuais, como o
fez o Florestan Fernandes, tendo em vista que eles não procuram ver as relações
de exploração entre as culturas, enxergando apenas diferenças entre elas. Para
a esquerda intelectual as culturas se diferenciavam pela diferente divisão da
riqueza social. Nesse sentido eles foram sendo marginalizados nas
universidades, e, acredito, deram espaço para os marxistas culturais.
No final ele responde a uma pergunta
que fizeram a ela sobre se era permitido a mistura de elementos culturais, no
caso, tocar funk em festa junina, ela responde positivamente, tendo em vista
que o tradicional não é tão fácil de se determinar. Vários elementos do São
João foram incorporados recentemente e são vistos como tradicionais, os fogos,
o milho, a festa é rural hoje, inclusive com a necessidade de fantasias de “matutos”
e comidas típicas, mas antes não tinha esse significado. Nesse sentido ela
acredita que a mistura, seria justa.
Particularmente, penso que
existe uma tendência em dar fim as tradições, isso é produto da
pós-modernidade, pois as culturas não se centralizam mais em espaços
geográficos e nem mesmo no tempo, festas podem ser transladas em suas datas e
locais, incorporar elementos de outras, no movimento de circularidade com
outras culturas, isso é chamado de hibridismo, e autora usa esse termo. A
questão é se existe preocupação com as tradições, se existe então é preciso
preservar, mas se não existe, então tanto faz se toca funk ou forró numa festa
junina, e na verdade, para que fazer festa junina, se pode-se fazer outras festas
em outros momentos, e quando se quiser? Dizer que a tradição pode ser
preservado com essas misturas penso que seja uma ideia falsa, e penso que essa
não deva ser a questão, mas sim se é importante ou não preservar.
Referências
ABREU, Marta. CULTURA POPULAR, UM CONCEITO E VÁRIAS HISTÓRIAS.
Nenhum comentário:
Postar um comentário