O
lugar de nascimento de Michel de Certeau foi a cidade de Chambéry, em maio de
1925. Sua formação se deu nas áreas de filosofia, letras clássicas, história e
teologia. Logo após sua formação ingressa na Companhia de Jesus e torna-se
padre em 1956. Segue fiel as suas crenças religiosas, sendo jesuíta até o final
da de sua vida. Tinha um interesse peculiar nos textos místicos da Renascença e
da Idade Clássica. Devido a isso sua área de interesse é bastante ampla, nosso
autor, se interessará tanto pela história como pela antropologia, linguística e
psicanálise. A vida religiosa do autor terá grande influência nos seu
trabalhos. Teve participação na Escola Freudiana de Paris, desde sua fundação,
em 1964, por Jacques Lacan, até sua dissolução em 1980. Ministrou aulas na
Universidade de Paris, Vincennes, entre os anos de 1968 a 1971, nos
departamentos de psicanálise e história, depois na Universidade de Paris, Jussieu,
nos departamentos de antropologia e ciências das religiões, onde dirigiu, de
1971 a 1978, um seminário de antropologia cultural. Entre os anos de 1978 a 1984,
também ministrou aulas na Universidade da Califórnia, em San Diego. Em 1984,
foi nomeado para ensinar e orientar estudos na École des Hautes Études en
Sciences Sociales, onde ofereceu curso sobre o tema “Antropologia histórica das
crenças – séculos XVII e XVIII”. Ele morre, em Paris, em 9 de janeiro de 1986.
Sem
dúvida o autor será de grande importância para a historiografia, tendo grande
contribuição para a história cultural, mas a sua influência não se limita a
história, outras áreas do saber como sociologia e antropologia vão beber
bastante de seus conceitos.
Certeau
traz inovações na questão da alteridade, fazendo uma análise inovadora do “estranho”
numa relação do “mesmo” e do “outro” “no teatro dos encontros humanos”.
Penso
que os estudos de psicanálise na escola freudiana com o Lacan tenham
contribuído para uma análise mais profunda das práticas cotidianas, onde o
autor consegue perceber que as ações dos indivíduos não são meras reproduções e
repetições dos costumes e valores dominantes, na verdade cada indivíduo dá um
sentido próprio aos gestos, podendo superficialmente parecer o mesmo repetido por
outros indivíduos há dez anos atrás, mas que em cada indivíduo se torna novo.
Isso, na minha avaliação, é mergulhar no mundo subjetivo, nas representações
tão trabalhadas por Gilles Deleuze, que foi seguidor de Lacan, tendo porém uma
divergência posterior.
Uma
outra influência foi a de Michel Foucault, porém há uma certa inversão da ideia
deste, tendo em vista que Foucault falou de um pode “capilar”, onde os
indivíduos absorviam o poder vindo das camadas mais altas, ou do Estado e instituições.
Certeau, por outro lado, vai dizer que as subsunções dos indivíduos não se dão
dessa forma, na verdade, os gestos estão dotados de atos de rebeldia, de luta
contra os dominadores.
O
autor quebrar com a ideia de uma aceitação e acomodação com a opressão. Ele demonstra
que os indivíduos ditos “consumidores” na verdade se apropriam dos signos dando
significados novos. Nesse processo eles rompem com a cultura transformando-a, o
cotidiano constitui-se um palco de transformação da mentalidade de uma época.
A
aceitação do que é imposto tem um sentido de microrresistência, essas por suas
criam microliberdades (Giard). Os sujeitos fazem uso de “manobras” para poder
modificar sua realidade, se por um lado aceitam, por outro estão ao mesmo tempo
resistindo e lutando contra a opressão.
Essa
situação dos sujeitos que vivem nesse teatro de peças cotidianas, lembra o
personagem João Grilo do auto da compadecida, em uma cena ele negocia com os
patrões para pode trabalhar na padaria, na qual com consegue convencer o patrão
a lhe contratar com o argumento de que iriam ser quatro trabalhadores pelo
preço de dois, sendo que o patrão queria o empregador queria um empregado que
pelo salário de um trabalhasse por dois. Mesmo estando numa condição de
submissão, o personagem consegue fazer pequenas conquistas que se dão de
maneira sutil. Durante todo o filme o personagem vai fazendo esse teatro da trampolinagem
e da arte de fazer.
Nesse
sentido o autor vai se interessar por essa arte de fazer na produção material e
imaterial dos sujeitos. Percebendo que em pequenas coisas como a confecção de
roupar e de bolos existe uma arte de fazer que resulta em ruptura. Nesse sentido
ele vai apresentar a necessidade de compreender a cultura e manifestações
populares a partir de ponto de vista, vendo como em cada gesto existem
elementos de resistência e trampolinagens. O autor afirma que as táticas não
são infinitas, elas têm limites, e isso é o que vai fazer com que outros
indivíduos repitam as mesmas táticas de outros para subverter a ordem. É nesse
sentido que as várias formas de rupturas através das “invenções” vão
constituindo uma formação cultural.
Ele
observa a importância dos mitos, e neles vê essa mesma relação de poder e de resistência
as imposições. É o caso de Frei Damião e seus milagres, suas ações, etc. A
população consegue interpretar os acontecimentos como forma de punição dos céus
aos seus opressores. A luta entre bem e mal passa a ter um significado em favor
dos oprimidos, sendo estes os bons e seus opressores os maus. Os mitos estão
cheios dessa concepção de luta e resistência, de “práticas de desvios”. Isso é
uma ruptura com as ideias dominantes, tendo em vista que as crenças religiosas
foram impostas por dominadores, e que a forma de aceitar do povo foi na verdade
uma ruptura com as tradições originais.
Referências:
CERTEAU, Michel. A invenção do cotidiano.
FOUCAULT, Michel. Microfísica o poder.
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